quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Microcefalia: Médica critica falta de testes e assistência a mães

Adriana Melo liderou grupo que primeiro identificou a zika em gestantes com fetos microcéfalos.
Adriana Melo reclama sobre omissão na Saúde

RIO — Elas chegam do sertão. Trazem o primeiro filho no ventre. Têm 16, 17 anos e são pobres, muito pobres. Vão a Campina Grande, cidade da Paraíba, em busca de ajuda. De certo, recebem o diagnóstico de que os filhos não nascidos sofrem de microcefalia associada à zika, cujos sintomas elas apresentaram no início da gestação. Histórias de moças assim, mães de primeira viagem, acumulam-se no Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto. E desesperam a responsável pelo atendimento e pesquisa, a médica Adriana Melo.

Adriana liderou o grupo que primeiro identificou no Brasil o vírus zika no líquido amniótico de gestantes com fetos microcéfalos. Ela não viu ainda sinais concretos de assistência para essas mães e seus filhos. Lamenta a desinformação e a falta de testes para se afirmar com certeza se as grávidas tiveram zika:

— O que o Ministério da Saúde está fazendo de concreto por essas crianças agora? Ainda não vi. Pernambuco montou um centro de atendimento. E aqui temos recebido muita ajuda da prefeitura de Campina Grande. Mas somos um município pobre e recebemos pacientes de todo o estado.

300 GRÁVIDAS COM SUSPEITA DE ZIKA

A Paraíba é o segundo estado com mais casos suspeitos de microcefalia. A procura por atendimento é tão grande que Adriana e sua equipe já nem perguntam mais, como era de praxe, de onde vem a grávida.

— Elas não têm para onde ir. Registramos e começamos a atender. Dos 30 bebês nascidos com microcefalia aqui, 13 são de Campina Grande.

O hospital, que também faz pesquisa, não tem condições de ir além do que já oferece.

— Não sabemos até quando vamos aguentar. Só o que aumenta é a epidemia. Temos 300 grávidas registradas com suspeita de zika e sequer podemos fazer o exame sorológico para saber se as mães tiveram mesmo a doença — destaca.

Ela frisa que, até agora, o Ministério da Saúde não é capaz de oferecer o teste sorológico — o único exame que pode dizer que uma pessoa teve o vírus depois de já ter se curado da doença.

— Assim, sabemos que as grávidas tiveram sintomas, mas não sabemos se tiveram zika.

Por sua assessoria, o Ministério da Saúde diz que o teste sorológico está em desenvolvimento na Fiocruz. Porém, não há previsão de quando estará pronto. Enquanto isso, o governo se prepara para distribuir, a partir de fevereiro, 500 mil testes de PCR. Este exame, porém, só detecta o vírus zika se for realizado no curto período em que a pessoa está doente. Ou seja, não pode dizer se alguém já teve a doença. Adriana se desespera:

— Neste momento, o teste sorológico é mais do que urgente. O governo deveria ter concentrado esforços nisso. Fala-se de zika e até agora ninguém tem ideia, de verdade, do tamanho da epidemia. Precisamos deste teste para ver essa dimensão. Sinto-me inútil.

VIAGENS DE MAIS DE 200KM

Gestantes apreensivas continuam a procurar todos os dias o hospital de Campina Grande. Algumas vêm com dificuldade de lugares paupérrimos no sertão. Adriana se preocupa com o futuro dessas mães e de seus filhos.

— Uma vez o filho nascido doente, como vai receber atendimento? E por toda a vida da criança? O mais triste é que muitas não sabem o que aconteceu com elas. São meninas ainda. Têm menos de 18 anos e esperam pelo primeiro filho. Ficaram doentes e ouviram falar da zika. Mas não entendem a gravidade da situação. Não sabem o que é microcefalia — diz a médica.

O fato de alguns bebês microcéfalos conseguirem mamar faz com que parte das mulheres ache que o filho é saudável.

— Há mães que são ingênuas e não tiveram quase instrução. Muitos desses bebês vão sobreviver. Em que condições? Não sabemos. Imagine atravessar 200 quilômetros sertão adentro para trazer todos os dias uma criança dessas, que precisa de atendimento altamente especializado. Hoje, é impossível — diz ela.

O teste sorológico é necessário, inclusive, para entender melhor a relação entre o zika e malformações, e a progressão da epidemia.

— Ouvimos falar de gente que morreu com sintomas que podem ser tanto dengue quanto zika ou chicungunha. Mas morreu de quê? Não sabemos! Sem esse teste não dá para saber.

OBAMA PEDE RAPIDEZ EM VACINA


WASHINGTON — A zika passou a preocupar os americanos. Anteontem, o presidente Barack Obama pediu uma “resposta rápida” ao avanço da doença nos Estados Unidos, apesar de todos os 24 casos registrados até o momento terem sido adquiridos em viagens ao exterior, sobretudo à América Latina. As três grandes empresas aéreas do país — Delta, United e American Airlines — informaram que aceitarão remarcação de passagens e troca de destinos, e até devolverão o dinheiro sem cobrança de taxas, por causa do temor da doença.

“O presidente destacou a necessidade de acelerar os esforços de pesquisa para aperfeiçoar os testes disponíveis, desenvolver vacinas e medicamentos, e garantir que todos os americanos tenham as informações sobre o vírus e tomem medidas para se protegerem da zika”, afirmou a Casa Branca, após a reunião de Obama com as autoridades de Saúde.

Na American Airlines, por enquanto, a troca ou reembolso, sem ônus, ocorrerá quando houver atestado médico informando dos riscos de viajar para os locais infectados — Brasil, Colômbia, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, Martinica, México, Panamá, Porto Rico e Venezuela. A Delta diz que também vai alterar gratuitamente os bilhetes de seus clientes para esses destinos e para outras localidades da África e do Pacífico que também registram a doença, desde que eles peçam as mudanças até 29 de fevereiro.

O “Washington Post” informou que o país está acelerando as pesquisas para vacina contra a zika, mas que os resultados não surgirão “do dia para a noite”, segundo o Instituto Nacional de Saúde.

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