sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Após polêmica em SP, casal do DF põe na web foto de filha vestida de PM

Menina de 4 anos é 'apaixonada' pela PM desde que viu comercial, diz mãe. Pais da garota não são policiais; garota celebrou aniversário em batalhão.

Em protesto contra as críticas feitas à foto de uma bebê com algema e cassetete em um post da Polícia Militar de São Paulo, um casal de Brasília decidiu compartilhar em redes sociais foto da filha caçula fardada com o uniforme do Batalhão de Choque, segurando uma tonfa (cassetete) e ao lado de carros da equipe. Nem a mãe, nem o pai ou familiares da criança são policiais.

A menina, que completa 4 anos no próximo mês, se encantou pela corporação há pouco mais de um ano depois de ver uma propaganda de um cursinho preparatório na TV. O terceiro aniversário dela foi comemorado em uma unidade da PM do DF, e Sophia ganhou roupas e brinquedos, além da alcunha de "capitã".

O encanto da criança fez os pais criarem páginas em redes sociais, que já têm mais de 10 mil seguidores. Na publicação de protesto, feita no nome da menina, eles lembram que Sophia também já foi alvo de críticas.

"Em protesto as críticas que a foto da garotinha vestindo a farda da PMSP e segurando uma tonfa gerou, resolvi postar minha foto e dizer que fico indignada com essas reações! Parabenizo os pais da garotinha e peço que não parem de divulgar esta linda foto. Também fui, e ainda sou, alvo de algumas críticas, mas recebo muito mais elogios das pessoas (isso conforta!) e acredito que fotos como essa, além de lindas, são uma super campanhas de valorização dos nossos nobres e corajosos guerreiros, incentivam mais crianças para o caminho do bem... sou a favor de mais mini PM's e menos mini pebas!!! (sic)", diz o texto.

"Ela viu a propaganda e disse: 'vou ser isso aí'. A gente saía com ela na rua, ela pedia para ser apresentada, jogava beijo. Aí ela foi fazer aniversário e perguntamos do que ela queria, como ela queria a festa. Ela disse que queria festa da Polícia Militar. Mas a gente não fez porque não tinha nada de artigo de festa de polícia, muito menos para menina. Aí combinamos com ela de não fazer festa e visitar um batalhão", diz.Mãe da garota, a estudante do curso técnico de enfermagem Liana Comin Camargo conta ter achado "um absurdo" as reações à imagem da bebê. Ela lembra da paixão que a filha criou pela corporação naturalmente, mesmo sem ter nenhum policial na família.

Liana encontrou então o telefone da unidade do Guará, onde a família a leva. Os policiais não só autorizaram a ida da criança como organizaram uma festa com tudo personalizado. Sophia ganhou farda administrativa, agasalho, blusa do Batalhão Ambiental e o uniforme de educação física, além de miniaturas de carros da polícia.

"E aí só aumenta o amor que ela sente. Ela quer toda as fardas da corporação, uma de cada batalhão. Ela gosta de fazer 'rondinhas' aqui na rua do Guará. A gente até parou porque achou que estava ficando meio perigoso. Mas sempre que tem algum evento da PM ela vai. Final de semana, quando a gente pode, a gente leva ela para visitar batalhão", diz a mãe.
A garota Sophia posa com uniforme da Polícia Militar e cassetete

A estudante conta que, se deixar, a filha se veste todos os dias com uniforme da corporação e que até para a escola a menina já foi de farda. Sophia tem bonecas com roupas da polícia e pediu à mãe que as etiquetas dos materiais do colégio deste ano fossem a PM.

"Ela viu a foto da menininha com o rostinho embaçado e perguntou o porquê. Eu falei 'filha, o pessoal viu a foto dessa menininha, aí estão falando mal, disseram que não podia deixar com a algema, com a tonfa'. Ela falou que sim, que podia, porque a menininha é policial igual a ela. Ela ficou em dúvida do porquê ela podia e a menina não. Ela disse: 'Todo mundo na rua gosta de mim, por que não gostam dela?', afirmou Liana.

A mãe disse que não sabe se a filha compreendeu a situação. "Tentei explicar de uma maneira que ela pudesse entender, que lá em São Paulo a foto não foi tão aceita como a dela é. Ela ficou caladinha. Não sei se ela entendeu direito o que eu quis explicar para ela. Acho que ela na verdade não conseguiu entender, porque para ela isso é normal."

A "foto-protesto" de Sophia foi feita em um passeio no Choque, o primeiro batalhão que ela visitou após o aniversário. "A maioria [das poses] é ela quem pede, 'tira assim, assim'. Ela vai subindo nas viaturas, vai pedindo para tirar foto. Ela já sabe os botões para fazer barulho."Liana conta que, desde que a paixão da filha tomou as redes sociais, pais mandam para o perfil fotos de outras crianças fardadas. A mulher diz sempre mostrar as imagens para a filha, que já sabe quem são os seguidores que mais curtem e comentam as publicações.

Para a estudante, a reação das pessoas à imagem representa uma "inversão de valores". "Os policiais são para Sophia como o Batman e o Homem-Aranha são para os meninos. [...] Policiais deveriam ser vistos como heróis de verdade, os outros são de quadrinho. Já pensou o que seria da sociedade sem os policiais? Eles se arriscam, deixam as famílias deles em casa para defender as nossas."

"Queira ou não, hoje em dia está tão difícil criar um filho no caminho do bem, no caminho do correto, então penso assim, qual caminho mais correto que o da polícia? A gente não sabe se ela vai ser policial, mas temos certeza que o convívio com pessoas boas que ela tem, o sentimento de proteção que ela tem também com o tanto de amigos dela, como ela fala, temos certeza que vai influenciar positivamente na vida dela", explica.

Com o marido gastrônomo e a primogênita de 7 anos, que sonha em ser médica, Liana diz só ver benefícios no interesse da filha pela polícia. Ela atualiza diariamente as páginas da menina nas redes sociais e afirma que a criança entende os limites das brincadeiras de ser militar.A mãe diz que o amor pela PM fez Sophia olhar para as outras profissões com mais respeito e também a estimula a querer ir para a escola para poder estudar e se tornar policial. "Ela vê o gari na e pensa que são amigos, porque eles limpam as sujeiras que fazem. Ela olha os bombeiros e pensa que eles ajudam as pessoas."

"Negativo, negativo, teve um comentário de um cara", lembra. "Foi a mesma coisa que aconteceu com a menina de São Paulo. Ele falou que era ilegal, que era crime, que a gente estava tirando a infância dela. Tirando como? A gente faz o que ela quer. Não é a gente que fala 'vamos a um batalhão nesse fim de semana'. É ela quem fala 'vamos a um batalhão hoje, papai? Ela sabe o nome dos batalhões, o nome dos cachorros. A reação ao comentário foi tão ruim que o cara apagou e se desculpou."

Caso de São Paulo
A foto da bebê foi publicada na noite de terça-feira (2) no Facebook e no Twitter oficial da Polícia Militar de São Paulo, com a mensagem “Boa Noite” e a hashtag #podeconfiarpmesp. Em nota, PM diz que a "farda simboliza valores fundamentais para a comunidade".

A imagem recebeu críticas de seguidores do Twitter, como “se ela soubesse o que vocês fazem, choraria de medo dessa farda”, “só faltou colocar um revólver na mão da criança. #semnocao”, “já vem com minispray de pimenta e bombinha de gás lacrimogêneo?”, “banalização e culto à repressão, deveria ser crime”, “que absurdo, quem foi o irresponsável que aprovou isso? Isso é uma vergonha”, entre outros.

Já na página do Facebook, a maioria dos comentários foi favorável à publicação da foto: “A essa pode me prender kkkkk linda foto parabéns”, “Boa noite Guerreiros!!! Muito bacana essa pequena PM, já tem perfil de policial !!! Ótimo trabalho à toda Corporação !!!”, “Boa noite. Quero fazer uma roupa assim pra minha neta. Linda essa princesa”, entre outros.

Para o coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos e um dos fundadores da Comissão da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da OAB, Ariel de Castro Alves, a exibição da imagem viola o artigo 232 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): “Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento”, com pena de seis meses a dois anos.

“A criança é colocada em uma situação constrangedora, vexatória. Foi exposta com uma arma, ainda que não seja uma arma de fogo, mas armas usadas para reprimir, como o cassetete e a algema para prender”.

“Não são brinquedos. Fazem parte dos instrumentos de trabalho da corporação. Houve uma utilização indevida. Foi claramente entregue por um adulto que faz parte da corporação”, completou.

Para Alves, a foto pode gerar problemas para a criança no futuro. “Por ela ter sido colocada com símbolos de repressão e violência de uma polícia vista como repressiva, ela pode passar por situações de constrangimento na escola”.

O coordenador acredita que a polícia deva retirar a foto ou se retratar. Castro também afirmou que vai pedir ao setor de Direitos Humanos do Ministério Público de São Paulo que analise o caso.

A Polícia Militar, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que as fotos publicadas nas redes sociais são enviadas por internautas. Além disso, afirmou em nota, que a farda simboliza, entre outras coisas, "honra" e "civismo".

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